VIOLÊNCIA CONTRA A MULHER - A IMPUNIDADE AINDA MATA
- Hágatha Guedes
- 18 de set. de 2017
- 5 min de leitura

Não há ruas seguras. Não há escolas seguras. Não há faculdades seguras. Não há empregos seguros. Não há casa seguras. Para uma mulher, nenhum lugar é seguro. Em 2016, uma em cada três mulheres sofreram algum tipo de violência. Cerca de 80% delas, dizem ter medo de sofrer algum tipo de violência. Só de agressões físicas, o número é alarmante: 503 mulheres brasileiras vítimas a cada hora. Esses números, que mostram o grave problema da violência contra as mulheres no Brasil, fazem parte de uma pesquisa feita pelo Instituto Datafolha e encomendada pelo Fórum Brasileiro de Segurança, divulgada em março desse ano. Segundo os dados, em 2016, 22% das brasileiras sofreram ofensa verbal, um total de 12 milhões de mulheres. Além disso, 10% das mulheres sofreram ameaça de violência física, 8% sofreram ofensa sexual, 4% receberam ameaça com faca ou arma de fogo. E ainda: 3% ou 1,4 milhões de mulheres sofreram espancamento ou tentativa de estrangulamento e 1% levou pelo menos um tiro. A pesquisa mostrou que, entre as mulheres que sofreram violência, 52% se calaram. Apenas 11% procuraram uma delegacia da mulher e 13% preferiram o auxílio da família. E o agressor, na maior parte das vezes, é um conhecido (61% dos casos). Em 19% das vezes, eram companheiros atuais das vítimas e em 16% eram ex-companheiros. As agressões mais graves ocorreram dentro da casa das vítimas, em 43% dos casos e 39% nas ruas.
O levantamento do Datafolha apontou que 40% das mulheres acima de 16 anos sofreram algum tipo de assédio, o que inclui receber comentários desrespeitosos nas ruas (20,4 milhões de vítimas), sofrer assédio físico em transporte público (5,2 milhões) e ou ser beijada ou agarrada sem consentimento (2,2 milhões de mulheres). Os assédios mais graves aconteceram entre adolescentes e jovens de 16 a 24 anos e entre mulheres negras. Só entre as vítimas de comentários desrespeitosos, 68% eram jovens e 42% mulheres negras. Já em assédio físico em transporte público, 17% eram jovens e 12% negras. E esse tipo e violência todo mundo percebe. Cerca de 66% dos brasileiros presenciaram uma mulher sendo agredida fisicamente ou verbalmente em 2016. E, em vez de o cenário ter melhorado, a sensação da maioria dos brasileiros (73%) é de que a violência contra a mulher aumentou ainda mais na última década. A maior parte das mulheres (76%) acreditam no mesmo. Esses números podem ser vistos no infográfico produzido pelo Fórum Brasileiro de Segurança Pública:

LEI MARIA DA PENHA
Em agosto, a Lei Maria da Penha completou 11 anos e o Instituto Maria da Penha lançou uma campanha para chamar atenção sobre os números da violência contra a mulher no Brasil. O site "Relógios da violência" faz uma contagem, minuto a minuto, do número de mulheres que sofrem violência em todo o país, com o objetivo de incentivar denúncias de agressão, que podem ser físicas, psicológicas, sexuais, morais e até patrimoniais. A Lei nº 11.340 leva o nome da farmacêutica cearense Maria da Penha, atualmente uma das principais ativistas na luta pelo fim da violência doméstica. Ela foi vítima do próprio marido e ficou paraplégica após as agressões e, mesmo assim, o viu ser absolvido por duas vezes depois de quase mata-la.
Apesar da lei ser um marco civilizatório, o rompimento do machismo institucionalizado na sociedade, ainda é processo longo e dificil. A assistente social e empresária, Sabrina Navarro Toleto, explica como o machismo atinge as mulheres na nossa sociedade: “Nós sofremos com o machismo em diversas esferas da vida. Somos subjugadas, e isso nos coloca em uma posição desprivilegiada no mercado de trabalho. A mulher é colocada em um papel de fragilidade, mas, ao mesmo tempo é atribuido a essa mulher diversas tarefas, tem que ser dona de casa, tem que ser trabalhadora, tem que ser mãe. Tem que assumir diversas funções ao mesmo tempo”. E ainda fala da definição da mulher perante a sociedade machista: “ Ser mulher é, necessariamente, passar por diversas situações, seja de constrangimento, seja ser subjugada, em que nossas atribuições são questionadas justamente pelo fato de sermos mulheres (…) E, muitas vezes, quando buscamos lutar por mudanças, ainda é colocado como vitimismo.”, ressalta Sabrina. A opressão é sistêmica e estrutural na nossa sociedade. Para romper o ciclo de violência, a autonomia financeira e emocional são apontadas por especialistas como as principais portas de saída, mas apesar dos avanços, a sociedade ainda não prepara essas mulheres para serem independentes.
A CULPA NÃO É DA VÍTIMA
No fim de agosto, um caso teve repercussão nacional, após um homem, com 17 passagens por agressão sexual, ser liberado depois de ejacular em uma mulher dentro de um ônibus em São Paulo. Entretanto, dois dias após o caso, o ajudante de serviços gerais Diego Ferreira de Novais, de 27 anos, foi preso inicialmente por suspeita de ato obsceno contra uma mulher dentro de um ônibus que passava pela Avenida Brigadeiro Luis Antônio. Na delegacia, acabou indiciado por estupro, porque foi acusado de esfregar o pênis no ombro da vítima e ainda tentado impedi-la de fugir dele.
No primeiro caso, ele chegou a ser indiciado pela Polícia Civil por estupro, mas em audiência de custódia, na quarta-feira (30), a Justiça o soltou alegando que "não houve constrangimento" da vítima. Para a advogada Marcella Pinheiro Reis, o juiz do caso foi muito literal, ao interpretar o crime de estupro sem levar em conta todo o contesto em que a vitima estava e ainda o histórico do agressor: “Acredito que também não foi correto ele dismistificar o crime de estupro, para enquadrar em ato obceno. (…) O código penal é muito antigo, muito arcaico, mas vem tentando se adaptar. Um exemplo disso, é a Lei Maria da Penha, que foi um avanço. Mas, no caso de estupro, é algo que deveria ter leis mais especificas e mais duras, para que não dependa somente da interpretação.”. A advogada ainda observa, que apesar da liberação do suspeito estar dentro da lei, cabe ao magistrado a sensibilidade para aplicar leis que foram incluídas no código posteriormente.
Este episódio, chocou todo país e levantou diversas questões importantes. Trouxe a público outros casos do mesmo tipo de violência, realizados pelo mesmo agressor. Um deles, foi o da estudante de 22 anos, Bárbara Hime Almeida, que compartilhou sua indignação na sua rede social em 16 de dezembro de 2016.
Bárbara conta, que no inicio da exposição do caso da vitima de agosto, não sabia que se tratava do mesmo homem. Mas como mulher e feminista, se sentiu indignada com o caso. Todavia, quando viu a foto do suspeito através de uma matéria e percebeu que se tratava do mesmo homem, ficou perplexa: “Quando eu vi que era ele, eu fiquei com muita raiva. Eu comecei a chorar de raiva. Quando eu vi tudo que ele tinha feito aquela semana e vi que eram várias meninas, nossa, eu nem sei explicar o que eu senti. E pela quantidade, imagina quantas mulheres passaram pela mesma coisa nas mãos dele e não denunciaram! No meu post mesmo, várias pessoas reconheceram ele depois”.
Bárbara ainda tenta colocar em palavras seus sentimentos, ao receber a noticia da libertação de Diego: “Acho que indignação é a palavra certo. Porque, quando pensamos que as coisas estão melhorando, que está mudando, vemos que não. Como eu disse para uma amiga, se ele tivesse roubado um celular, por mais barato que fosse, ele teria ficado preso. Parece que para a sociedade, um bem material, vale mais que a dignidade de uma pessoa”.



É importante salientar que a única forma que modificar esse quadro, é através da educação e denúncia. Por isso, no caso de ver ou sofrer qualquer tipo de violência, seja física, moral ou verbal, ajude e denuncie, ligue 180, você não estará sozinha.

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